quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

Pequenas Conversas (ou O Mínimo Existencial)

Hoje foi dia de faxina aqui em casa. Não, caro leitor, não fui EU quem limpou a casa (não que eu não goste de limpeza ou não saiba fazê-la. Apenas não faço A FAXINA, entende?). A responsável por tal empreitada foi minha faxineira, a Birina, também conhecida como Biriguete ou Birinight. Trata-se de uma senhora de meia-idade, nascida e criada na zona rural do Município onde atualmente vivo. 

Analfabeta de pai e mãe, como se diz. Nunca foi à escola, o que não lhe impediu de crescer com louvável caráter e honestidade inquestionável. E adooooora falar... Meu Deus, como fala a Birina! A cada semana ou quinzena são diversas histórias diferentes. A filha da patroa se divorcia do marido; a neta adoece; a filha mais velha sofre um aborto; o genro gasta todo o dinheiro do mês em bebida e jogatina; a gastrite dela ataca; é muita poeira no sítio onde ela mora... PARA, BIRINA!!! JÁ CHEGA!!! Eu nunca disse isso. Educadamente, eu sempre finjo que presto atenção no que ela diz.

 Hoje ela chegou por volta das 8:30 h. Tocou a campainha e eu fui atender:

"Aff, calor do cão. Nam!"
"É, tá quente, Birina..."
"Como é que tá? Tá bonzinho? E o neném? E a esposa? E a família?"
"Todo mundo bem." - Acredite você ou não, hoje eu não tava com muita paciência.

Eis que ela pega o cesto de roupas sujas e vai para o quintal. E volta em 5 minutos:

"Acabou o sabão e o amaciante. É bom comprar mais, né?"
"Tu vai lá?"
"Vou. É que é bom comprar as coisa (sic) logo de uma vez, né? Deixar tudo limpin (sic)..."

Dei o dinheiro e ela foi. E volta em cerca de 15 minutos:

"Calor do cão. Nam!"
"É..."
"Meu marido tá me traindo com uma jumenta!"
"Que história é essa Birina?"
"A vizinha lá de casa disse que viu ele por trás da cerca onti (sic) comendo a jumenta lá de casa. Pode, Vitu? (sic)"
"Tá se garantindo mais não, Birina?"
"Ôxe, quem peste quer aquela besta-fera?"

Ri muito da Birina. Mas conhecendo seu histórico de falar um bocado, resolvi cortar o assunto pegando minha toalha:

"Deixa eu banhar, Birina... Trabalhar."
"É bom a pessoa tomar bãin (sic) antes de trabalhar, né? Depois nesse sol tá aquele cheiro de suvaco pôdi (sic) que num tem carai da bobônica que guente (sic eterno aqui...)"
"É", falei sorrindo e indo para o banheiro.

Quando entrei, percebi que esta tinha sido a conversa mais longa que eu tinha tido pessoalmente com alguém nessa semana. E talvez seja a única.

É o que acontece quando se mora sozinho. Não, não quero que você tenha pena de mim não. Esse relato é só para reforçar a ideia de que pequenas coisas podem e devem ser aproveitadas. Você que já passou, passa atualmente ou passará por isso, sei como você se sentiu, como se sente, ou como se sentirá.

Terminei o banho:
"Tchau, Birina!"
"Tchau, Vitu!"

E fui trabalhar, no império do papel, da solidão e do silêncio.

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