domingo, 26 de fevereiro de 2012

Não Matarás?

Você mataria alguém? No sério mesmo: mataria? Não, não de jeito nenhum. A maioria esmagadora das pessoas (e a minoria, espero, que não seja leitora deste blog, ou se for, que goste muito de mim) dirá categoricamente que JAMAIS MATARIA ALGUÉM.

Tudo bem, eu acredito em você.

E se essa pessoa estivesse ameaçando sua vida? E se fosse um assaltante dentro da sua casa? E se fosse um terrorista perigoso? Se fosse o assassino de alguém amado? Se fosse um inválido pedindo para morrer? Ou um estuprador solto na vizinhança? Você não mataria o Hitler se tivesse a oportunidade? O Osama Bin Laden? O maníaco do parque?

Começou a abrir exceções em sua mente?

E se fosse oportunizado a você matar sem qualquer punição? Se alguém garantisse que você poderia matar sem que houvesse qualquer consequência jurídica ou social para você? Você faria? Mesmo que fosse alguém que você nem ao menos conhece? Matar por matar, você faria?

Não, você provavelmente está respondendo que não.

Mas o famoso Experimento da Obediência de Stanley Milgram, conduzido na universidade de Yale na década de 60, revelou que se pedido de maneira adequada, quase todos nós cederíamos e nos tornaríamos assassinos obedientes.

Milgram disse aos voluntários que eles faziam parte de um experimento para determinar o efeito da punição no aprendizado. Um dos voluntários (que era na verdade um ator em cooperação com Milgram) faria o papel do Aprendiz e tentaria memorizar uma série de palavras. Os outros voluntários (os voluntários reais) acompanhariam a leitura com um gabarito e dariam uma descarga elétrica no argüido a cada vez que ele errasse. A cada resposta errada os choques aumentavam 15 volts de potência.

O famigerado experimento em prática.


O experimento começava. O aprendiz errava propositalmente e logo a potência do choque chegava a 120 volts. Nessa altura o aprendiz começava a chorar e a reclamar da dor. Em 150 volts o aprendiz começava a gritar de dor e a implorar pra que o deixassem sair. É claro que era tudo atuação, mas os voluntários, que nada sabiam, começaram a hesitar e perguntaram aos pesquisadores o que deveriam fazer. A resposta era sempre a mesma “O experimento requer que você continue”.

Milgram não tinha nenhum interesse nos efeitos da punição no aprendizado. O que ele queria na verdade era saber quanto tempo as pessoas demorariam a se recusar a apertar o botão de choque. Será que permaneceriam obedientes à autoridade dos pesquisadores a ponto de matar alguém?

Convocação para participar do experimento

Para a surpresa de Milgram, mesmo podendo ouvir os gritos agonizantes do aprendiz que vinha da sala ao lado, dois terços dos voluntários continuaram a pressionar o botão até atingir a potência máxima de 450 volts, quando o aprendiz caiu em um silencio assustador, aparentemente morto.

Alguns dos voluntários tremiam e suavam, enquanto alguns riam histericamente, mas continuaram a apertar o botão. Mais perturbador ainda: quando os voluntários não podiam ver nem ouvir o aprendiz a cooperação era de quase 100%. O que os olhos não vêem o coração não sente, afinal.

Posteriormente Milgram comentou “Eu diria, com base em milhares de pessoas que observei durante os experimentos e na minha própria intuição, que se um sistema de campos de extermínio como os da Alemanha nazista fosse implantando nos Estados Unidos, seria possível encontrar trabalhadores e encarregados pelo seu funcionamento em qualquer cidade de médio porte do país”.

Quer outro exemplo bem escrotinho também? Já ouviram falar de Sylvia Marie Likens?

Não? Deixe-me apresentá-la.


Ela foi vítima de tortura e assassinato, morreu aos dezesseis anos de idade no caso que foi descrito pelo procurador público como o "mais terrível crime cometido no estado de Indiana". Foi torturada até a morte por Gertrude Baniszewski, seus filhos e diversas outras crianças da vizinhança (prestem atenção nisso! São crianças matando crianças). Seus pais eram atores circenses e deixaram Sylvia e sua irmã Jenny aos cuidados da família Baniszewski três meses antes da sua morte em troca de 20 dólares por semana.

Inventando as mais ridículas desculpas, Gertrude “punia” Sylvia de forma abusiva: incluindo, entre outras coisas, queimar sua pele com cigarros e a fazendo tirar a roupa e a forçando inserir uma garrafa de Coca-Cola em sua vagina.

E o que é pior: Baniszewski começou a encorajar Hubbard, o jovem namorado de uma de suas filhas, e outras crianças da vizinhança a atormentar Likens, o que era prontamente atendido!

Após isso, Gertrude começou a agredir Sylvia frequentemente, até que a garota foi retirada da escola e não lhe foi mais permitido sair de casa. Quando Likens urinou em sua cama, foi trancada no porão da casa e proibida de usar o banheiro. Mais tarde, ela foi obrigada a consumir a urina e as fezes espalhadas pelo porão. Nesse período, Baniszewski começou a tatuar no dorso de Sylvia a frase "I'm a prostitute and proud of it!" com uma agulha aquecida. Como Gertrude não conseguiu terminar a frase, Richard Hobbs, outro jovem “gente boa” da vizinhança” a finalizou.

Sylvia tentou fugir poucos dias antes da sua morte, após ouvir um plano de Baniszewski em deixá-la morrer em um bosque das redondezas. Todavia, Sylvia foi pega por Gertrude, sendo como punição amarrada no porão onde comeu somente bolachas secas. Em 26 de outubro de 1965, após múltiplas escoriações, ela morreu de Hemorragia cerebral, segundo o relatório médico.

Veja o absurdo: no julgamento, ficou provado que várias crianças iam à casa de Gertrude, a convite de seus filhos (que eram crianças na época), somente para torturar a jovem Sylvia, que estava trancada no porão.

Gertrude no Julgamento


Eu acredito que todos nós podemos, sim, de acordo com as condições, matar alguém. Mesmo sendo esta uma afirmação cruel, dizer que não é hipocrisia. A impunidade é a chave mestra para que nos tornemos assassinos. Com uma boa justificativa, uma possibilidade séria de escapar impune e um “empurrãozinho”, você seria sim, capaz de matar.

E isso não quer dizer que você tenha algum desvio de personalidade ou seja um sociopata. Quer dizer apenas que você é humano e tem, como tudo na vida, um lado negro e sem grandes freios morais. Todo mundo já desejou matar alguém pelo menos uma vez na vida. E admitir isso é algo sério, mas necessário.

(Notas: é possível encontrar vídeos do Experimento de Stanley Milgram no Youtube, mas resolvi não por aqui, pois contém imagens pesadas. Já a história de Sylvia é possível ver com mais precisão no excelente filme Um crime americano, de 2007).

(PS: este post foi meio “reimoso”, não foi?)

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